segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Solilóquio

Subo incansavelmente rumo à região central da cidade, mais precisamente rumo ao marco zero que estipularam. É ali que tudo começou. Dali a cidade se espalhou. Ganhos contornos, avenidas, praças, casas, prédios, parece sem fim.

De um lado e do outro, pessoas conversam, balbuciam palavras incompletas, enroscam-se em frases, sozinhas. O diálogo é monólogo. Parecem enlouquecer.

No ônibus cantarolam as músicas daqueles pequenos rádios, porém ensurdecedores. O celular não fala mais, não estabelece contato, não há mais interlocutor, o pequeno aparelho tecnológico é tudo e não é nada. O seu dono reproduz apenas o que sua varinha mágica possibilita. Conduzindo o veículo segue o motorista que também canta apenas a rádio preferida. O cobrador reclama, o passageiro observa e não dá atenção. Com quem ele fala?

Naquele bar o senhor toma calma a sua cerveja, observando a todos que ali adentram. Resmunga, gesticula ninguém lhe dá atenção, mas ele não queria ser atendido. É um momento só seu apenas dele. Ponto.

Num dos bancos daquela praça o senhor conversa com a estátua de Mário Quintana, que não se cansa de aconselhá-lo. Ele parece não ouvir ao poeta dos passarinhos. Mário é menino, é guri, é ave, Mário voa num senhor que deixou de envelhecer.

Retorno à minha morada exausto por não ter falado com ninguém. Mas são aquelas duas entrevistas pelas quais fui submetido? De um lado uma psicóloga e suas teorias procurando saber mais de mim. No outro, eu que não me canso de falar. Tenho a certeza de que aquelas informações que passeia a ela serão deletadas quando a vaga for preenchida. A psicóloga não se lembrará mais de mim, nem do meu discurso. Não houve troca de informações, de nada valeu o que eu disse. Solilóquio.

No apartamento acima ao meu a senhora canta enquanto arrasta os móveis pela madrugada. Parece falar sozinha, dialogar consigo. De que forma? Não sei.... Só sei que não há mais com quem dialogar.

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