sábado, 31 de agosto de 2013

A banalidade e nossa inutilidade

Há anos esta satisfação que se aloja no ser humano em tornar tudo ao seu entorno banal, incomoda-me. Não me sinto contemplado, muito menos quero compactuar desta trama sórdida e ignorante que nos desfaz.
            Definitivamente estamos nos acostumando, não criando questionamento mais para nada. A tudo dizemos amém. Fim. The End. As questões não são mais lançadas, pois quem decidiu foi o chefe da empresa e pronto, ou mais uma Medida Provisória foi estabelecida e nada foi criticado, mataram mais um na Zona Norte ou na Zona Sul, a mulher do vizinho se suicidou e nenhuma providência foi tomada. Estamos nos individualizando, fechando-nos para o nosso entorno, almejamos apenas os benefícios ao nosso casulo, não conseguimos pensar coletivamente. Que amor é este que bradamos aos nossos semelhantes se ao menos conseguimos levantar o rosto ou retirar ao fone de ouvido e dar um bom dia a pessoa que esta do seu lado? Como posso passar o dia todo grudado na tela do maldito do computador sem dar um oi para o meu colega de trabalho? E esta cara de mosca morta ou de um cão vítima da raiva que a todo dia vem contigo? E aí a gente se acostuma, pois vem aquele que diz: “É normal”, “Faz parte”. Não faz! Temos sim o direito de estarmos tristes, de estarmos de TPM, de termos brigado com os nossos cônjuges, mas peraí... os demais seres humanos não são suas vítimas, fazem parte do seu entorno, e não tem culpa de seus problemas pessoais...

            É necessário que nos renovemos, busquemos novas alternativas, procuremos enxergar ao passado com os olhos do presente, a vida deve sim ser analisada sincronicamente. Os acontecidos diacrônicos são importantes, porém para que eu possa estruturar o meu presente e construir o futuro. Não podemos achar normal Fulano matar Sicrano e tudo ficar bem. Apreciarmos milhares de pessoas desabrigadas e não tentarmos ajudar, seja com doações, palavras acolhedoras ou mesmo ajudando-os a se estruturar, cada um sabe sim do seu potencial e sabe que pode ajudar, contribuir de alguma forma. Como disse Guimarães Rosa: “O animal satisfeito dorme”. Não podemos ser escravos da soberba ou mesmo da preguiça, pois lá fora há uma série de pessoas que não conseguem se levantar e que procura alguém para que possa se reerguer, se reinventar. Enquanto eu como aqui neste domingo ensolarado esta carne assada na mais pura e verdadeira brasa gaúcha, lá fora há dezenas de crianças sentido ao cheiro deste suculento pedaço de carne e que anseiam por um pedaço.
            Os meus valores são importantes e dentre estes a solidariedade deve ser trabalhada, deve ser trazida à tona, não pode ficar submersa; tenho que reavivar o amor, sentimento nobre e verdadeiro, capaz de modificar e transformar vidas, mas não posso ficar esperando que ele caísse do céu ou brote naquele jardim que eu nem rego mais... Tenho que caminhar, buscar ajudar. Vivemos um período em que a higienização humana está sendo proposta de maneira velada com a eliminação da população pobre que vive próxima dos estádios que servirão como centros de treinamento ou mesmo campos para as grandes partidas da Copa do Mundo de 2014 e não estamos nos articulando, divulgando, nos posicionando, temos sim o dever de emitir o nosso parecer e bradar a todos os cantos que os pobres estão sendo eliminados, escondidos dos europeus que aqui estarão, dos norte-americanos que aqui absorverão às nossas riquezas, desfrutarão das nossas crianças etc. São incêndios criminosos que não se esclarecem, são famílias sendo retiradas de seus lares com a desculpa de uma vida promissora em outra região, são carroceiros sendo multados e tendo seus veículos apreendidos e seus cavalos sacrificados, pois é... Ninguém faz nada. Participamos de inúmeras situações, de inúmeras reuniões e não levantamos às vozes para estes problemas, nos calamos diante da pressão velada imposta pelos nossos governantes.
            Caso nos acostumemos a tamanhos problemas geraremos e nos tornaremos uma nação de inúteis. Como bem disse o poeta Eduardo Alves da Costa em uma das mais brilhantes poesias que já li, “No Caminho com Maiakovski”: “Na primeira noite, eles se aproximam e roubam uma flor do nosso jardim: não dizemos nada. Na segunda, já não se escondem. Pisam as flores, matam o nosso cão e não dizemos nada. Até que um dia o mais frágil deles entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a luz e, conhecendo o nosso medo, arranca-nos a voz da garganta. E já não podemos dizer nada.”.


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