Há anos esta satisfação que se
aloja no ser humano em tornar tudo ao seu entorno banal, incomoda-me. Não me
sinto contemplado, muito menos quero compactuar desta trama sórdida e ignorante
que nos desfaz.
Definitivamente
estamos nos acostumando, não criando questionamento mais para nada. A tudo
dizemos amém. Fim. The End. As
questões não são mais lançadas, pois quem decidiu foi o chefe da empresa e
pronto, ou mais uma Medida Provisória foi estabelecida e nada foi criticado,
mataram mais um na Zona Norte ou na Zona Sul, a mulher do vizinho se suicidou e
nenhuma providência foi tomada. Estamos nos individualizando, fechando-nos para
o nosso entorno, almejamos apenas os benefícios ao nosso casulo, não
conseguimos pensar coletivamente. Que amor é este que bradamos aos nossos
semelhantes se ao menos conseguimos levantar o rosto ou retirar ao fone de
ouvido e dar um bom dia a pessoa que esta do seu lado? Como posso passar o dia
todo grudado na tela do maldito do computador sem dar um oi para o meu colega de trabalho? E esta cara de mosca morta ou de um cão vítima da raiva que a todo dia vem
contigo? E aí a gente se acostuma, pois vem aquele que diz: “É normal”, “Faz parte”. Não faz! Temos sim o direito de estarmos tristes, de
estarmos de TPM, de termos brigado
com os nossos cônjuges, mas peraí... os demais seres humanos não são suas
vítimas, fazem parte do seu entorno, e não tem culpa de seus problemas
pessoais...
É
necessário que nos renovemos, busquemos novas alternativas, procuremos enxergar
ao passado com os olhos do presente, a vida deve sim ser analisada
sincronicamente. Os acontecidos diacrônicos são importantes, porém para que eu
possa estruturar o meu presente e construir o futuro. Não podemos achar normal
Fulano matar Sicrano e tudo ficar bem. Apreciarmos milhares de pessoas
desabrigadas e não tentarmos ajudar, seja com doações, palavras acolhedoras ou
mesmo ajudando-os a se estruturar, cada um sabe sim do seu potencial e sabe que
pode ajudar, contribuir de alguma forma. Como disse Guimarães Rosa: “O animal satisfeito dorme”. Não podemos
ser escravos da soberba ou mesmo da preguiça, pois lá fora há uma série de
pessoas que não conseguem se levantar e que procura alguém para que possa se
reerguer, se reinventar. Enquanto eu como aqui neste domingo ensolarado esta
carne assada na mais pura e verdadeira brasa gaúcha, lá fora há dezenas de
crianças sentido ao cheiro deste suculento pedaço de carne e que anseiam por um
pedaço.
Os
meus valores são importantes e dentre estes a solidariedade deve ser
trabalhada, deve ser trazida à tona, não pode ficar submersa; tenho que
reavivar o amor, sentimento nobre e verdadeiro, capaz de modificar e
transformar vidas, mas não posso ficar esperando que ele caísse do céu ou brote
naquele jardim que eu nem rego mais... Tenho que caminhar, buscar ajudar.
Vivemos um período em que a higienização humana está sendo proposta de maneira
velada com a eliminação da população pobre que vive próxima dos estádios que
servirão como centros de treinamento ou mesmo campos para as grandes partidas
da Copa do Mundo de 2014 e não
estamos nos articulando, divulgando, nos posicionando, temos sim o dever de
emitir o nosso parecer e bradar a todos os cantos que os pobres estão sendo
eliminados, escondidos dos europeus que aqui estarão, dos norte-americanos que
aqui absorverão às nossas riquezas, desfrutarão das nossas crianças etc. São
incêndios criminosos que não se esclarecem, são famílias sendo retiradas de
seus lares com a desculpa de uma vida promissora em outra região, são
carroceiros sendo multados e tendo seus veículos apreendidos e seus cavalos
sacrificados, pois é... Ninguém faz nada. Participamos de inúmeras situações,
de inúmeras reuniões e não levantamos às vozes para estes problemas, nos
calamos diante da pressão velada imposta pelos nossos governantes.
Caso
nos acostumemos a tamanhos problemas geraremos e nos tornaremos uma nação de
inúteis. Como bem disse o poeta Eduardo Alves da Costa em uma das mais
brilhantes poesias que já li, “No Caminho
com Maiakovski”: “Na primeira noite, eles se aproximam e
roubam uma flor do nosso jardim: não dizemos nada. Na segunda, já não se
escondem. Pisam as flores, matam o nosso cão e não dizemos nada. Até que um dia
o mais frágil deles entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a luz e, conhecendo
o nosso medo, arranca-nos a voz da garganta. E já não podemos dizer nada.”.
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